Transporte aéreo e mobilização de equipes salvam bebê com cardiopatia grave

cardiopatia congenita

O nascimento do pequeno Bruno, na Santa Casa de Porto Alegre, exigiu uma verdadeira força-tarefa devido às enchentes que assolam o Rio Grande do Sul. Moradora de Caxias do Sul, a gestante Cassiane Rech precisou ser transferida de helicóptero até a capital para realizar o parto na terça-feira (07/05), em função do diagnóstico de uma cardiopatia congênita no bebê.

Além da necessidade de intervenção cirúrgica ainda nos primeiros dias de vida, a segurança do recém-nascido exigia o cuidado especializado das equipes da instituição. “Tive muito medo”, confessou a mãe, com a voz ainda carregada de emoção, sobre os momentos de incerteza no hospital da serra gaúcha, onde encontrou todo o suporte até ficar sabendo da operação. “Medo de não conseguir chegar, medo de tentar vir pelas estradas e ele nascer no meio do caminho. Medo de nada dar certo”, contou.

Em acompanhamento no Instituto Materno-Fetal da Santa Casa desde a 29ª semana, o bebê foi diagnosticado durante os exames de pré-natal com uma cardiopatia grave chamada transposição das grandes artérias. Segundo o cardiologista fetal Marcelo Brandão da Silva, trata-se de uma condição que inverte a ligação normal dos principais vasos sanguíneos do coração, impedindo o fluxo de sangue oxigenado para o corpo. “A artéria pulmonar e a aorta se formam em posição invertida. Isso significa que logo após o nascimento, quando o bebê começa a respirar, o sangue não encontra seu caminho natural para chegar até os pulmões e fazer a oxigenação”, explica o coordenador da área de Cardiologia Fetal da Santa Casa.

Com a gestante em trabalho de parto desde segunda-feira (6) à noite e sem tempo hábil para chegar em Porto Alegre por terra, em virtude dos bloqueios das estradas, a única alternativa para a família era via aérea. “Ao tentar viabilizar o transporte da paciente, descobrimos que já havia a programação de um transporte aéreo de outro paciente de Caxias para a nossa UTI pediátrica e conseguimos incluí-la na mesma aeronave”, conta o cardiologista, destacando também a dose de sorte para garantir a vida do bebê.

Passada a angústia inicial, Cassiane conseguiu realizar o trajeto entre as duas cidades em cerca de 30 minutos ainda na terça-feira de manhã, abrindo caminho para a chegada em segurança do primeiro filho. Enquanto isso, o pai, Adriano Fernandes dos Santos, também travava sua própria batalha contra o tempo e a distância. Após a decolagem do helicóptero, ele encarou a estrada e viajou durante 9h30 em um percurso que em tempos normais seria de apenas 2 horas.

Nascimento e primeiros cuidados

Em um esforço inicial que também incluiu as equipes da Maternidade e da UTI Neonatal, o pequeno Bruno nasceu às 16h30, com 39 semanas e 3.340 kg, e recebeu o atendimento da equipe de cardiologia pediátrica ainda nos primeiros minutos. “Esses bebês quando nascem são pacientes de risco, às vezes eles precisam de cateterismo já na primeira hora de vida e depois, normalmente entre o segundo e o quinto dia, precisam realizar a cirurgia de correção total”, explica a coordenadora da área de Ecocardiografia Pediátrica, Lívia da Rosa Pauletto, responsável pelos primeiros exames no pequeno Bruno.

“Esse foi um caso de risco: a gente estabilizou o bebê, iniciou a medicação para manter as comunicações abertas, necessárias nesse tipo de atendimento, mas no final conseguimos levar ele para a UTI pediátrica sem precisar desse cateterismo inicial”, lembra a médica, que integra a equipe do Instituto Materno-Fetal.

Foi já no segundo dia de vida que o pequeno Bruno precisou passar pela primeira cirurgia, decisiva para sua sobrevivência. Segundo o cirurgião cardiovascular Paulo Prates, também chefe do Serviço de Cirurgia Cardíaca Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio, o procedimento para corrigir a transposição das grandes artérias durou cerca de cinco horas e consistiu em desconectar a aorta e a artéria pulmonar e trocar suas posições para os ventrículos apropriados. Tudo isso em um coração de apenas 100 gramas.

“Trata-se de uma cirurgia bastante delicada, que exige uma estrutura de alta complexidade e uma equipe multidisciplinar atuando em todas as etapas de atendimento”, destaca o cirurgião, que comemorou o sucesso do procedimento realizado ao lado da cirurgiã cardíaca Emma Salazar: “Ocorreu tudo da melhor maneira possível e agora a primeira etapa da recuperação é na UTI, com média de oito a dez dias de internação. Depois, o bebê já pode ir para o quarto, onde fica mais alguns dias até a alta”, explica.

Um início marcado por desafios

Desde o diagnóstico, ainda durante a gestação, a jornada do pequeno Bruno foi marcada por desafios. Não bastasse os que já eram previstos, a inundação das estradas exigiu um resgate aéreo heroico para receber o atendimento necessário que garantisse sua vida. “Chega de emoção né, filho”, brincou a mãe, enquanto relatava a história ao lado do pequeno, que segue se recuperando na UTI Pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio.

Segundo o cardiologista Marcelo Brandão da Silva, com uma recuperação pós operatória dentro do esperado, a expectativa é que ele tenha uma vida absolutamente normal. “Essa é uma cardiopatia extremamente grave, mas se não fosse realizada a cirurgia nos primeiros dias após o nascimento, ele não teria chance de sobreviver”, ressalta.

Por isso, a importância da transferência para Porto Alegre. “Os riscos de um transporte intermunicipal após o nascimento também eram preocupantes, com possibilidade do bebê não resistir”, frisa a cardiologista Lívia.

Hoje, em recuperação, Bruno segue em sua jornada graças a mobilização de diferentes profissionais que não mediram esforços para tudo dar certo. Sua vitória é também um lembrete da força do povo gaúcho e da importância da esperança, mesmo em tempos desafiadores.

Texto e imagens: Vinicios Sparremberger/Santa Casa de Porto Alegre

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